4.1.13

foi assim

calma aí, seu individuozinho meio esperançado
enquanto andas para aí a dar voltinhas e mais voltinhas à tua vida
cai o céu antes que tenhas tempo de olhar para cima
desce agora antes que as únicas voltas que dês, são já naquela caixa bem forrada

antes que me esqueça de te dizer mais alguma coisa,
não te esqueças antes tu.
toda a tua vida tem vindo a ser desmascarada
ora foi para o padre, ora foi pela vizinha ali de cima
ali em cima está o vento, cá em baixo está o fado
não é assim que se canta, mas até que me espantam

estas palavras que saem das máquinas antigas
essas que já nem tinta têm, que já foram gastas em outros invernos
ah, salta à letra que os números tu já os tens

vives para aí, meio sozinho nesses confins 
que ninguém, senão tu, te queres morto.
são fidalguia, cortesias de outras eras
enquanto agora vivem em desesperos provincianos

ah, ah, ah, 
pum, tum, bum,


agora já fizeste mais uma pausa...
pausa para quê? 
algum motivo em especial? algo que te atormente, meu filho?
ainda não foste receber o subsídio de desemprego?
ai, valha-te deus que assim não te aguentas!
e então esta complicação das luzes?
ouvi dizer que lá em lisboa, até estalam.

eu cá não tenho dessas manhas,
tenho é de trabalhar ao ritmo das máquinas
 

ah, diacho! 


compele-te ao trabalho, 
que eu cá sei do resto, meu querido filho. 
não sou teu pai mas já te fiz um seguro contra todos
(que é esse seguro senão uma defesa contra ti próprio?
ainda hoje lá te levantaste, andas-te lá pelas bermas das máquinas,
safaste-te de ir lá fumar um cigarrinho)

para aqui ando eu, com estas manias dos séculos passados
vivem dentro de alguma coisa
não é do meu mealheiro que ainda ontem fiz a revisão do meu destino mensal.


:

então? ainda estás aí? já fumaste tudo? 
ah... já não existem pessoas como estas. 
foste lá fora: sonhaste contigo mesmo
eras diferente - sonhemos, portanto.

Era uma vez um príncipe encantado, cantava bem, enquanto ele próprio sonhava... Todavia (que palavras para estes contos - não me digam nada: não é por nada) uma vez fez um agudo tão grande que espantou um javali que também por ali estava. O que é que se sabe ao fim de contas: 

tumba!


não era ele senão um javali. :

ainda estás para aí a sonhar? já foste ter para a tua companheira?
essas máquinas infernais, que não te querem - 
lá estão elas todo o santo dia. 
comem-te por dentro. deixa de respirar:
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foi assim que tudo aconteceu
(o quê não me perguntem; o outro também foi bater à porta da guerra e não sabia qual,
ainda que não fosse por mal). 


começa entretanto esta nova fase de desdém pelo santo senhor 
que só sabe das suas máquinas e o apreço que elas têm pelas suas mãozinhas:
Não me hão de comer, aquelas safadas!

:

à laia do que disse o Whitman, 
prefiro o Keats! 
se puderes,
traz-me antes o Rimbaud! 

:

que odes. mera junção.
que intelectualidade 
ah, diabo! seja cego, surdo e mudo.

esses não tiveram filhos que lhes valessem.
fica agora o encanto, desse tão belo espanto. 
eles que gritavam. entretanto.
ficam agora belos. 
viveram desgastados. 
míseros miseráveis.
esqueci-me do Hugo. 
esse

ah, compadre!


não sabes o que dizes, rapariga. 
tentativas impressionistas aos caracóis
que te meteram nesta alavanca
(já não te vêm, os livros já perderam o cheiro
ainda que existam autocarros para a minha terrinha)

saudosismo, 
:

foi assim que devia ter acontecido - 
tu pediste o que não devias ter pedido.
quem, afinal, se perdeu fui eu. 

agora mais não sei. 
vivo cansada do que não faço. 
limitada pelo que não me limita.

extremamente pobre quem por aqui se fica. 
são ideias, são factos, não são verdades, de todo.
quem é que inventou essa palavra?
se já estava baralhada, fico por aqui. 

fico-me por aqui, por ora. 

(por agora)